A gasolina que queima presidentes.

Em março de 2016, escrevi a alguns amigos que o próximo presidente do Brasil seria Jair Bolsonaro. Passado o deboche imediato que sofri, o processo de impeachment, o governo Temer, e as eleições, essa previsão confirmada veio à toma. E tive meus 15 minutos de fama com meia dúzia de entrevistas a veículos que pouca gente leu. Em uma delas, a repórter me perguntou: como analista, quando você vislumbrou ter começado o início do processo de golpe contra a presidenta Dilma. Os termos golpe, e presidenta, na mesma frase, entregaram o destino que a conversa teria.

Estava cansado, sem terno, não queria brigas, muito menos debates acalorados aquela hora. Era meio de noite. Por isso, na resposta trouxe uma polêmica que mudaria o rumo da prosa, mas que era apenas uma teoria. Não tinha escrito nada sobre. Afirmei de pronto que o início do fim ocorrera antes mesmo da posse para o segundo mandato. Disse que segurar o preço da gasolina ao longo da eleição tinha jurado de morte o futuro do segundo mandato. Fiquei parecendo um idiota aos olhos da jornalista. Ficou claro para ela que meu anonimato até o momento era bem justificado.

Hoje, 16 de maio de 2023, mais de quatro anos depois, acordo com a notícia de que a Petrobrás mudará a política de preços dos combustíveis, sem considerar as flutuações do mercado internacional. Trocando em miúdos, o que acontecer com o dólar aqui e com o petróleo lá fora não afetará de imediato os preços no mercado interno. Vou deixar para os economistas o problema que isso causará nas ações da empresa e junto aos investidores internacionais, que acionarão a justiça para reaver seus prejuízos. Isso é tão óbvio que nem merece análise.

Bolsonaro passou 2022 inteiro criticando os aumentos sucessíveis nos combustíveis, sabendo que isso minava sua popularidade, justamente junto ao core de seu eleitorado: brasileiros classe média de médias e grandes cidades, com seus carros financiados e que juntavam os caquinhos da pandemia. Tentou de tudo pra mudar a política de preços da empresa. Queria segurar pra não se queimar. Não conseguiu. A imprensa, a justiça, os vingadores, todos foram contra. O que restou ao presidente foi a redução de impostos, o que nossos jornais também não pouparam. Lembra daquela jornalista, que lamentou a desoneração da gasolina, dizendo que era dinheiro de rico que estava sendo economizado?!

Essa conta da nova (velha) política de preços vai chegar, e o tesouro (nós), teremos que arcar com o prejuízo. E com os processos que serão vencidos pelos investidores estrangeiros nas esferas internacionais com a queda no valor das ações. Não será hoje, nem amanhã. Mas que virá é certo. Vale lembrar que a Petrobrás chegou a valer míseros 4 bilhões de dólares no auge dessa política de 2014 e dos escândalos de corrupção, e que demorou mais de meia década para ela voltar a valer os 600 bilhões que vale hoje.

Ver essa volta ao passado, que segurou os preços lá em 2014, e custou o emprego da Dilma em 2016, parece não ter ensinado, nem a Bolsonaro, nem a Lula. Ela segurou, venceu as eleições, mas caiu em seguida. Bolsonaro tentou segurar, não conseguiu, o preço subiu, inversamente à sua popularidade, e também pagou um preço. Lula agora consegue o que Bolsonaro tentou, e parece que, pelo menos, não será alvejado pela imprensa. Sem vozes contrárias, o cidadão menos avisado tende a comemorar a medida, e muitos jornalistas vão dizer que esta é a grande boa notícia que o governo precisava. Na semana da votação do arcabouço fiscal, é bola dentro em termos políticos. E aquela jornalista certamente aprovará a medida, relativizando a queda nas ações da empresa e dizendo que Petrobrás deve servir ao povo e não aos acionistas.

O que me resta é torcer para estar errado: que o petróleo se acalme, que o dólar caia, a inflação caia, e a nova velha política de preços dos combustíveis não traga prejuízos à Petrobrás. Se tudo isso se confirmar, a vida segue linda, e o dia de hoje significará apenas a boa notícia que tanto esperamos. E não o início do fim de mais um governo.  

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